Introdução
Investir na bolsa é uma excelente ideia. Eu faço-o há anos com resultados que me levam a continuar a investir. Se estás a começar é importante perceber como funciona.
Há duas abordagens de investimento: a versão burra e a versão inteligente, ou melhor: a abordagem “técnica” e a abordagem fundamental.
Abordagem técnica
Antes de começar a cilindrar esta abordagem, vamos ver o que é: a ideia não tem nada a ver com o que se está a investir mas com os padrões matemáticos de subida e descida das cotações e mercados.
O que irás encontrar se optares por seguir esta teoria é que rapidamente te vês de encontro com padrões, estatística, nomes e fórmulas complicadíssimas, que tem um grau de “probabilidade” de certeza. E claro: só 1 gajo no mundo inteiro é que “sabe” do que está a falar.
Se alguém matematicamente já tivesse chegado a uma fórmula de prever os mercados, estavam todos trilionários. A realidade é que todos os “traders” que se dizem bem-sucedidos, se fores a ver, vendem cursos de como ser trader e não necessariamente fazem dinheiro por fazerem “trading”.
Como um analista do maior banco de investimento aqui em Protugal com quem uma vez me reuni me disse: “Bem, a ideia desta malta é atirar padrões, gráficos e fórmulas para cima do mercado, a ver se alguma coisa cola.”…
Para que saibas, este analista estava inserido num grupo responsável por biliões. Está tudo dito.
Ainda assim vamos ver algumas destas “fórmulas” que esta malta usa.
MACD
Moving Average Convergence Divergence – este indicador é uma ferramenta usada para identificar médicas que indicam se o mercado é Bullish(se está a subir) ou Bearish(se está a descer). A prioridade dos traders é identificarem trends(tendências)
O indicador MACD é feito por três componentes.
1 – MACD line – mede a distância entre duas médias
2 – Signal line – identifica mudanças no price momentum e dá indicador de compra e venda
3 – Histograma – representa a diferença entre o MACD e o Signal Line
A calcular o MACD são consideradas duas linhas: o MACD e o Signal Line.
O MACD é mostrado como um histograma (representação gráfica da distância entre as duas linhas). Se o MACD atravessa o Signal Line por baixo, é visto como um sinal de compra, se atravessar o Signal Line vindo por cima, é visto como um sinal de venda.
Head and Shoulders
Pois…o shampoo? Não. Mais um padrão “técnico”.
A ideia aqui é que depois uma subida e subida e descida, há uma subida e descida maior, seguida de uma subida e descida menor.
A linha que atravessa os “ombros” é a neckline(linha do pescoço).
Os “lucros” vêm quando se corta o pescoço ao meio.
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Reverse Head and Shoulders
Este é ao contrário do outro. Se um não funciona, o outro ao contrário “deve” funcionar… Está tudo dito. Aqui é tudo ao contrário.
RSI (Relative Strength Index)
O RSI é um indicador de momentum, medido de 0-100.
30 indica oversold, 70 indica overbought.
É definido em períodos de 14: 14 dias, 14 meses…
O RSI cresce se o número de ganhos cresce e desce se o número de perdas cresce.
Moving average
Em português, média móvel. É um indicador estatístico, que fixa um intervalo.
Por exemplo: média móvel de 200 dias.
Pode começar de 0-200, de 1-201, 2-202, 50-250…
A média móvel pode ser simples ou exponencial/ponderada.
Em ambos casos, a ideia é a mesma: tentar identificar uma tendência de preço de mercado usando diferentes grupos de datasets. O problema desta conversa é que já se está à procura de um resultado a mudar o grupo de estudo o que por si só já se classifica como um bias. Ainda assim, esta malta insiste…
Bollinger Band
Esta ferramenta usa 2 desvios-padrão(positivos e negativos) da Média móvel simples, para identificar preços de acções.
Este indicador calcula-se por primeiro fazer a média de um conjunto de preços da acção, e duas linhas (uma acima e outra abaixo). As bandas são calculadas por adicionar e subtrair um desvio-padrão da média-móvel.
Os traders encontram o preço de compra e venda da acção entre as bandas de Bollinger.
Stochastic Oscillator
Um oscilador estocástico, é um indicador que compara o preço de fecho de sessão de uma acção com um intervalo de preços de fecho do mesmo título num intervalo de tempo. Utiliza um intervalo de 0-100 e o período típco de análise são 14 dias. Um valor baixo indica que se deve comprar, um valor alto indica que se deve vender.
Abordagem fundamental
Esta á abordagem que investidores de longo-termo usam e que eu também subscrevo.
Aqui, ao contrário de sinais e esparguete artístico-matemático, olhamos para a empresa do ponto de vista de análise: demonstrações financeiras, em que mercado operam, quem têm de concorrência, quem está na direcção da empresa, quais são os planos de expansão, etc.
Acho incrível o facto de as pessoas se vão comprar um carro, um portátil ou um frigorífico, dão-se ao trabalho de comparar marcas, ver especificações, vão lá testar, lêem reviews, perguntam a colegas antes de tomarem uma decisão.
No entanto para comprar acções, atiram dinheiro às cegas e esperam pelo melhor. Ou ainda pior, investem com gestores de fundos que nem sequer conhecem e esperam que eles estejam muito preocupados que lhes tivessem dado dinheiro.
Onde é que esta conversa entra na análise de acções?
Uma acção é uma parte de uma empresa. Um negócio com pessoas reais que sobrevive e prospera se tem resultados. Estes resultados vêm das decisões de quem está por detrás da empresa.
Por isso se abordamos um negócio do ponto de vista de análise fundamental, temos de saber lêr as demonstrações financeiras da empresa, comparar os resultados que esta tem comparativamente a empresas comparáveis, se tem lucro, prejuizo, qual o nível de endividamento, se tem perspectivas de continuar a operar durante muitos mais anos, e quem são as pessoas por detrás do “leme” desta empresa.
A abordagem fundamental tem duas vertentes:
1 – quantitativa: a empresa é vista puramente do ponto de vista quantitativo. É o pessoal do excel que põe a empresa na “máquina de lavar” de análise financeira. No fim aparece um número e é isso que vale. Apesar de concordar em parte com esta abordagem, há outros aspectos a considerar do ponto de vista da próxima abordagem.
2 – qualitativa: a empresa é vista do ponto de vista do potencial que tem, onde é difícil implementar um modelo matemático para definir esta avaliação. Ainda assim é importante porque dá um grau de confiança na empresa.
a) Modelo de negócios – o que faz, como faz e os planos de futuro.
b) Vantagem competitiva – o que faz melhor que a concorrência? Como vai vencer? Como se mantem numa posição de vantagem sobre os concorrentes?
c) Gestão da empresa – quem está por detrás do leme? Quem são estas pessoas, qual o perfil? Têm história de serem curruptos, honestos, bons com pessoas? Péssimos a tomar decisões?
d) Corporate Governance – Qual a relação entre a gestão, directores e investidores na empresa? Há transparência ou dificuldade de obter informação, entre todos? Se a comunicação não é transparente e aberta é porque não têm interesse nisso. O que é que isto te diz se tiveres a pensar em investir nesta empresa? Pensa no teu banco ou na empresa para quem trabalhas. Eles não são transparentes contigo, porque é que haverias de continuar com eles?
Por outro lado se a empresa para onde trabalhas tem uma cultura aberta de fácil comunicação e de equipa, o que te diz isso relativamente à empresa?
Análise Financeira
É por aqui que começa tudo. Se ainda não tens conhecimentos suficientes sobre balanços, demonstrações de resultados e demonstrações de fluxos de caixa, dedica tempo do teu dia a aprender. Não é necessário ser revisor oficial de contas, mas saber lêr a informação financeira da empresa é essencial.
Uma empresa tem quatro declarações fundamentais:
Balance Sheet
O balanço representa um “printscreen” da posição financeira da empresa num período de tempo. É dado pela fórmula: Activos = Passivos + Capital Próprio.
Activos trazem dinheiro para a empresa. Estes são financiados por capital próprio dos sócios (o dinheiro que investiste para iniciar o negócio) e passivos (financiaste um imóvel com um empréstimo do banco). Os passivos tiram-te dinheiro da empresa.
Income Statement
Em português: “Demonstração de resultados por naturezas”, mostra vendas menos custos totais incluindo impostos. A diferença é o resultado líquido.
Cashflow Statement
Em português: “Demonstração Individual de fluxos de caixa”, mostra as entradas e saidas de dinheiro na empresa durante um período.
Divide-se em três partes:
-Fluxos de caixa operacionais
-Fluxos de caixa de investimento
-Fluxos de caixa financeiros
O cashflow statement tem depois no fim uma secção que soma estes três e soma à presente “caixa e equivalentes no inicio do periodo” que é o resultado do exercicio do ano anterior.
Statement of Shareholder’s Equity
A actividade da empresa tem um directo resultado nos detentores do capital.
Esta declaração mostra as alterações do valor do capital próprio do inicio ao fim do exercicio do periodo.
Preço intrínseco vs Preço de mercado
Para avaliar se iremos fazer dinheiro com a compra de uma acção tem de se determinar o valor desta. Se comprarmos uma acção que está demasiado sobrevalorizada, dificilmente iremos fazer dinheiro, pois eventualmente o valor virá por ai abaixo. Ao contrário, se adquiririmos um título que está desvalorizado e houver um catalista que provoque a subida deste valor, é um bom investimento, pois comprarmos uma parte de uma empresa que vale mais do que pagámos.
Como se determina o valor de uma empresa?
Há vários métodos:
Método#1 – Cost approach
Método#2 – Market approach(relative value)
Método#3 – Discounted Cash Flow(Intrinsic value)
Método#1 – Cost approach
Aproximação por custo ou análise de transacções precedentes é uma forma de avaliação da empresa onde se compara esta com outras similares que tenham sido adquiridas recentemente.
Um método conhecido é o EPV (Earnings Power Value), onde a questão se põe é: quanto custa comprar isto tudo que o negócio tem, adquirir os clientes todos, instalar as fábricas, lojas e contratar as pessoas? No fim do cálculo, se o valor por acção é superior ao valor presente da empresa lider de mercado, então é mau negócio. Caso contrário, deve-se avançar.
Método#2 – Comparables Analysis
Análise por comparáveis, é um método de avaliação onde se compara o valor presente de um negócio com outros similares através de múltiplos: P/E, P/S, P/BV, EV/EBITDA e outros rácios.
A lógica é ver o seguinte: Por exemplo comparando P/E entre duas empresas:
-se um título esta a ser transaccionado por $10.00 e a empresa tem $2.00 de resultados líquidos, tem um P/E =5
-se outra similar está a ser transaccionada por $10.00 e a empresa tem $4.00 de resultados líquidos, tem um P/E =2.5. Ao mesmo preço temos uma empresa que tem mais resultados líquidos, o que é à partida mais favorável.
Claro que não se pode decidir apenas por um indicador. Uma empresa poder ter menos resultados liquidos porque investiu mais nesse período.
São indicadores apenas e devem ser vistos como tal.
Método#3 – DCF Analysis
Este método DCF (método de cashflows descontados) é uma forma de trazer para o presente o valor da acção que achamos com base de suposições de desenvolvimento da empresa para o futuro.
Quanto prevemos que será o crescimento de vendas, resultados etc. Daí usando o TVM(time value of money) retornamos ao presente o valor do título.
A questão dúbia aqui é com que estamos a partir de suposições, pelo que apesar deste método ser estremamente popular, pelos ninjas do excel que trabalham na banca de investimento, pois tem muitas “continhas” para fazer, tem o grau de erro do próprio analista ao inferir valores futuros de crescimento da empresa, EBITDA e outras métricas que podem ou não concretizarem-se.
Por exemplo uma entrada de tecnologia nova pode alterar completamente a indústria onde está inserida esta empresa, dado os clientes optarem por uma solução diferente. Onde é que está a KODAK hoje? Pois…
Ainda assim o DCF é um importante método de análise para nos dar uma “diagonal” do que vale a empresa com base no conhecimento corrente e um “determinado” grau de certeza do que irá produzir e obter de resultados no futuro.
Exemplo práctico
Um negócio tem um ciclo composto por 4 fases:
1 – Introdução
2 – Crescimento
3 – Maturidade
4 – Declínio
Se o projecto mostrou na fase 1 que tem “pernas para andar”, pode ser cotado em bolsa para ficar acessível a mais investidores.
A questão que te deves pôr é se procuras uma empresa que:
-esteja em fase de crescimento, com risco mais elevado.
-em fase de maturidade, com crescimento mais lento e menos risco.
-em fase de estabilização ou mesmo declínio. O risco de investires na IBM não é de perderes o teu dinheiro, é de não fazeres nenhum.
Investe no que conheces e compreendes com base em anos de experiência
Ganhar experiência e conhecimento em alguma disciplina, onde te tornas uma autoridade, demora anos. Não é da noite para o dia.
Não acredites em generalistas, é tudo uma cambada de falhados. Um generalista tem um potencial gigante, mas só começa a ter resultados quando se foca.
Nessa altura sim, têm toda a minha atenção, porque tomaram uma decisão de usar todo esse potencial a fazer uma coisa bem. Tornarem-se especialistas.
Porque te estou a dizer isto? Porque se vais comprar uma acção numa empresa, tens de conhecer bem o negócio e compreender o que fazem. Ou tu és o especialista e sabes o que estás à procura, ou falas com um especialista que te diz o que tem de estar a acontecer.
Eu sou vendedor de seguros de vida. É o que sei fazer. Practico todos os dias a melhorar os meus conhecimentos prácticos de lidar com pessoas e criar e treinar equipas de vendedores.
Sei bem como é difícil criar, expandir e manter uma equipa de grandes vendedores. Especialmente numa indústria onde a taxa de pessoas que desistem a menos de um ano é de 92%.
Por isso, se estiver a olhar para acções a comprar, vou ver empresas com sales-forces na indústria de seguros de vida, porque sei como funciona.
Se alguém o está a fazer e me mostra com base em resultados que sabe o que está a fazer e continua a crescer, é claramente uma acção para mim a comprar.
Se estás em panificação, cerâmica, ou o que fôr, tens naturalmente mais conhecimentos que pessoas fora da indústria. Deves começar por aí.
Algumas palavras finais sobre investidores e especuladores
Toda a gente é investidor até começarem a ver as acções a reduzirem valor.
Pensa numa acção que compres como um investimento que estás a fazer por pelo menos cinco anos. Se não te vires a manter essa posição aberta por pelo menos cinco anos, não invistas.
Não deves investir na bolsa a não ser que estejas preparado para perder esse dinheiro e tenhas uma fonte de rendimentos independente disso.
Qualquer acção que compres não é um bilhete de lotaria, é parte de um negócio que estás a adquirir. Enquanto os principios fundamentais que te levaram a adquirir esse negócio se mantiverem, deves manter a tua acção.
Quantas acções deve ter o teu portfolio?
Há quem tenhas centenas de acções, há quem tenha uma. No meu caso pessoal, acho que não deves ter mais que dez accções. Desta forma consegues estar em cima do acontecimento de cada uma das empresas e decidir se aumentas, ou reduzes o investimento, tendo em conta a informação que tens à data.
Conclusão
Neste artigo abordamos as duas vertentes de investimento no mercado bolsista.
Falámos da abordagem fundamental a ter quando se adquire parte num negócio, porque se deve ter um portfolio concentrado e as razões pelas quais se deve manter uma perspectiva a longo-prazo do investimento que se fez.
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